Quando o vigilante liberou o acesso do visitante fardado, foi surpreendido por três homens armados que anunciaram o assalto
Uma camisa polo azul escura, com o brasão da Polícia Civil, foi o passaporte para o início de duas ações criminosas, na manhã da segunda-feira (23), quando um roubo a uma empresa de segurança e uma tentativa de assalto em um depósito de bebidas foram registrados no intervalo de duas horas em Lauro de Freitas e Salvador. Segundo relato de testemunhas, nos dois casos, um dos integrantes da quadrilha vestia o uniforme policial.
A primeira ocorrência foi por volta de 6h na sede da empresa de segurança e vigilância MJR — que funciona em uma casa de muros com cercas elétricas e vigiada por câmeras de segurança, no bairro das Pitangueiras, em Lauro de Freitas.
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Modelo de camisa usada por policiais civis: apenas em operações(Foto: Almiro Lopes/Arquivo Correio)
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De acordo com o titular da 23ª Delegacia (Lauro de Freitas), Joelson Reis, quatro bandidos chegaram ao local em um Fiat Punto vermelho, de placa não identificada. Do carro desceu um homem vestido com uma camisa semelhante à farda da Polícia Civil.
“No depoimento, uma das testemunhas disse que o indivíduo trajava uma camisa polo azul escura com os dizeres ‘Polícia Civil’. Ele chegou ao portão e perguntou por um funcionário dizendo que foi ao local para entregar um currículo”, disse Reis.
Quando o vigilante da empresa liberou o acesso do visitante fardado, foi surpreendido por três homens armados que anunciaram o assalto. Dentro do imóvel, quatro funcionários foram rendidos e tiveram os celulares roubados.
Os bandidos ainda levaram um revólver do vigilante e um colete à prova de balas. A quadrilha tentou acessar o depósito de armas da empresa, que fica dentro de um cofre. Mas não conseguiram abrir o equipamento. Reis informou que, na fuga, os bandidos levaram duas CPUs, onde acreditavam que era salvo o material do sistema de videomonitoramento do imóvel.
Mas a gravação ficava em outro local e, de acordo com Reis, as imagens foram encaminhadas para o Departamento de Polícia Técnica (DPT), onde serão analisadas.
Sem preparo
“A informação sobre a camisa (da Polícia Civil) veio de testemunhas, eu ainda não posso dizer se a farda era verdadeira ou falsa. Ainda não vi a filmagem, já que o HD foi direto para o DPT. Aguardo o retorno do material e as nossas equipes já estão na rua levantando mais informações”, afirmou Reis.
Para ele, a ação não foi realizada por um grupo especializado, devido à falta de preparo dos envolvidos. “Se fosse uma quadrilha especializada, teria operado de forma diferente, utilizando outros equipamentos. Não acredito que eles estavam interessados nas armas. Atuaram no acaso, aproveitando o isolamento do local”, completou Reis.
Novas testemunhas serão ouvidas nos próximos dias e a polícia acredita que pelas imagens das câmeras de segurança da empresa poderá chegar aos suspeitos. Questionado pelo CORREIO, o representante da MJR, que não quis se identificar, optou por não fornecer dados sobre a ação dos bandidos, mas informou que colabora com a polícia e também investiga por conta própria a autoria do assalto.
Guarani
Foi também um homem com uma camisa polo azul escura, com o brasão da Polícia Civil, que chegou, por volta das 8h40, ao Depósito de Bebidas Lourenço, na Rua Professor Flávio de Paula, no bairro Guarani. Se passando por policial, pediu informações sobre um assalto que aconteceu há três meses no estabelecimento.
Com uma arma na cintura, não despertou a desconfiança do funcionário que o atendeu, até anunciar o assalto. Também armados, outros dois homens desceram, segundo testemunhas, de um Fiat Punto vermelho que estacionou na entrada do depósito e foram em direção aos funcionários que estavam do lado de fora.
Os funcionários do depósito e outros dois encarregados de uma cervejaria que iam começar a descarregar as bebidas correram, mas foram pegos pelos assaltantes. “Eles disseram que iam matar todo mundo, que não era para correr”, contou o encarregado que preferiu não se identificar.
O dono do estabelecimento, no entanto, não abriu a grade e os ladrões desistiram da ação. “Não ia imaginar que um homem com farda ia me assaltar. Só deu tempo de correr para dentro e fechar”, contou. Os assaltantes não conseguiram entrar no depósito, que possui um gradil que preserva o interior da loja.
A ação durou poucos minutos e, segundo um funcionário, nada foi levado pelos bandidos. “Eles ainda ficaram por aqui, tentando roubar, mas quando viram que não dava para entrar, fugiram”, contou um funcionário. Uma câmera de segurança instalada na entrada do depósito pode ajudar nas investigações.
Segundo a 37ª Companhia Independente da Polícia Militar (Liberdade), que foi até o local após a tentativa de assalto, foram realizadas diligências na área, mas ninguém foi encontrado. A rua onde o depósito fica é deserta e residencial.
Em outubro do ano passado, os assaltantes agrediram o dono do estabelecimento. Até o início da noite de ontem, o proprietário não tinha informado o caso à 2ª Delegacia (Liberdade), responsável pela área. Segundo a Polícia Civil, não há confirmação se os casos — da empresa de segurança e do depósito de bebidas — têm relação.
Distintivo
A Polícia Civil informou, via assessoria, que geralmente os agentes não usam esse fardamento para diligências. Ainda segundo a assessoria, a camisa azul escura é utilizada para atividades internas e, em caráter especial, em grupo — durante operações, por exemplo.
Na camisa azul há o bordado da função do policial, o brasão e o nome ‘Polícia Civil’ nas costas. A assessoria disse ainda que, caso o cidadão suspeite da abordagem pode pedir para ver o distintivo de identificação do policial.
Se o suspeito se recusar a mostrar a identificação, de imediato a pessoa pode acionar a polícia e informar a situação. A Polícia Civil orienta ainda que não se deve reagir se o assalto se concretizar.
Até uniforme de estudante é usado por bandidos
Para o disfarce em ações criminosas, bandidos têm usado fardas de outras categorias profissionais, do Exército e até uniformes estudantis. Em agosto do ano passado, dois homens foram mortos durante o assalto a um sindicato, na Avenida San Martin.
Um deles usava uniforme de uma empresa de bebida, e não despertou a atenção no local. Em junho, três jovens foram presos, um deles com farda escolar e armado com um revólver, quando supostamente se preparavam para roubar uma lotérica em Brotas.
Em janeiro do ano passado, bandidos usaram uniformes do Exército para explodir caixas eletrônicos no município de Araci. Na capital, no mesmo mês, um ladrão vestido como promotor de vendas da Elma Chips enganou a vigilância e seis homens armados roubaram o HiperBompreço do Salvador Norte Shopping, em São Cristóvão. Foram feitos 50 reféns na ação.